Eu insisto no meu ponto. As pessoas não precisam que o Estado lhes alugue
bicicletas. Não faltam bicicletas pelo país e com um salário médio de 700€
mensais, compra-se uma bicicleta de 300€ com cerca de 10 dias de trabalho.
As pessoas precisam sim, de condições para pedalar em segurança e de espaço
para estacionar as suas bicicletas nos lugares de origem e de destino.
Quando vou a Lisboa como turista, não consigo pedalar na cidade, porque no
prédio dos meus pais onde pernoito, há uma garagem com três pisos de
estacionamento com centenas de lugares para automóveis e zero para
bicicletas. Após várias missivas enviadas à administração do prédio, foram
todos os pedidos declinados. Também não há lugares para bicicletas na via
pública (e sim, lugares de bicicleta a encher por Lisboa custariam centenas
de vezes menos). Não preciso que o Estado me alugue bicicletas, quero é que
me dê condições para usar a minha. Não faz qualquer sentido o Estado estar
a subsidiar o aluguer de um transporte individual, cujo custo de obtenção e
manutenção é extremamente barato para um cidadão comum. Bens muito mais
essenciais e de primeira necessidade como alimentação ou vestuário não são
grosso modo subsidiados pelo Estado, à exceção de IVA mais baixo, logo não
creio que as bicicletas devam ser também subsidiadas. Esta retórica é
enveredar, no meu modesto entender pela “conversa do desgraçadinho” que até
precisa de apoios públicos para operar, sendo que no meu modesto entender,
diria até, refletindo um pouco mais, que os sistemas de bicicletas
partilhadas obedecem em boa parte ao paradigma da hegemonia automóvel, na
medida que fortalecem a imagem para a opinião pública que é uma mobilidade
apoiada com dinheiros públicos; logo não deixa por isso de ser interessante
também asseverar, que este tipo de sistemas são muito comuns nos países
mais auto-dependentes, como o caso dos países das américas, sendo pouco
comuns nos países com uma forte cultura da bicicleta, como a Holanda ou a
Dinamarca.
Também já apresentei gráficos que demonstram que não houve relação entre o
crescimento da repartição modal alocado à bicicleta em Copenhaga, com o
fiasco do seu sistema de bicicletas partilhadas. Apesar do fiasco que foi,
a repartição modal continuou a crescer. No outro extremo da balança, em
Itália também foi um fiasco, pela razão contrária, ou seja, porque
simplesmente os Italianos têm a mesma dependência automóvel que tem
Portugal, padecendo dos mesmos problemas que nós relacionados com
insegurança rodoviária em meios urbanos (vide o exemplo de Roma). Eliminem
os obstáculos sociais e físicos à utilização da bicicleta, e veremos as
pessoas a pedalar. Enveredar pela política da dependência dos apoios
públicos para trazer mais ciclistas para a rua, creio que no longo prazo,
traz mais desvantagens do que vantagens, pois transmite uma visão
totalmente distorcida para o público e para os contribuintes, de que este
tipo de mobilidade precisa de dinheiros públicos para operar.
Questionemo-nos: o que é que fez aparecer mais ciclistas na avenida Duque
d’Ávila? Um café ligado à bicicleta, um parque para bicicletas, uma
ciclovia ou talvez uma maior restrição ao fluxo do tráfego automóvel. O que
é que faz as pessoas pedalarem em Amesterdão, tendo a maior taxa do mundo
de utilização bicicleta, com cerca de 60%, contrastando com 0,5% de Lisboa?
Tudo isto recorda-me a velha estória que nos contam quando somos crianças
de estarmos a querer construir a casa (com dinheiros públicos) pelo
telhado. Pois eu queria apenas que o Estado me desse bases sólidas, para
que eu próprio pudesse construir a casa de raiz.
João Pimentel Ferreira http://joãopimentel.eu