Enganei-me… queria naturalmente comparar a Fertagus com a CP, não com a Carris. Não sei como pude trocar os nomes lool.
Essa separação entre o que é um negócio público e um privado e para que servem é demasiado simplista.Os lucros dos privados existem porque pagam salários e servem para a empresa e crescer e fazer investimentos (porque ninguém trabalha para aquecer… afinal o que é lucro? lucro é o que todos tiramos dos nossos empregos). No público isso é substituído por défices… o que não tem mal nenhum. A questão é que isto pode acontecer em ambos os cenários. O que me interessa a mim, são as contas do Estado, nunca as do privado, e como utente a qualidade do serviço e a universalidade de acesso. Nada disto implica que quem presta o serviço seja uma entidade pública ou privada. É só isto.
Se só as partes rentáveis da CP são cobiçadas por privados, é porque estes sabem (ou desconfiam…) que se ficassem com elas receberiam zero apoios do Estado, e não haveria como o serviço sobreviver. Mas a ser assim, não era o privado que estaria a abandonar o serviço, seria o Estado. Para se comparar esse cenário, tem que se comparar com o cenário em que o Estado deixaria de pôr euros na CP. O que achas que aconteceria? É difícil dizer… mas desconfio que no mínimo muitas linhas suburbanas desapareceriam porque jamais teriam capacidade para gerar receita suficiente. Nesse aspecto operadores públicos e privados são sempre iguais… ninguém vive sem ganhar… a diferença é que sempre achámos os primeiros merecedores de apoios e os segundos não, ainda que tudo seja serviço público. Mas ambos, seja público ou privado, são contratados pelo Estado… o único motivo que existe para que não façamos verdadeiros contratos de serviço público (eles já são feitos… às vezes são é maus porque o Estado não presta apoios como devia a um serviço que é público) com operadores privados é meramente ideológico.
Se 1€ de dinheiros públicos investido num operador privado resultar num melhor serviço para o mesmo preço por utente que o mesmo € investido num operador público, ou a mesma qualidade de serviço acontecer com menos custos para o Estado quando o operador é privado, então prefiro o negócio com o privado sem dúvida. Independentemente desse negócio dar lucro ao privado ou não. E empiricamente… estes cenários não são raros! É essa a questão.
Por isso é que acho que todos nós, e o Estado, nos devíamos de despir de preconceitos em relação a tudo o que é privado, e que o Estado faça bem as continhas na hora de investir salvaguardando todas as opções, em vez de partir logo para operadores públicos sem estudar todas as hipóteses.
Vieira do Minho é sede de um concelho onde há volta existe muita população. Reside mesmo muita gente ali à volta em muitas vilas naquela zona. O único prestador de saúde público de que dispõe é um centro de saúde que funciona só a partir das 20h… numa zona muito mal servida de transportes públicos e que se precisares de fazer um raio-X urgente ou vais ao privado ou arranjas forma de ir a Braga (porque nem o centro de saúde tem radiologia…). De resto, tem várias clínicas e consultórios a prestar cuidados de saúde à população, incluindo radiologia.
E agora pergunto, e se for mais barato o Estado assinar um protocolo com alguns desses prestadores em vez de alargar o horário do centro de saúde e dispor o mesmo com equipamentos de raio-x, com tudo o que tal implica? Olha que não é nada rebuscado que o protocolo saia mais barato… o oposto parece-me mais difícil.
Tenho a sorte da minha empresa me pagar seguro de saúde, ainda que mesmo que não tivesse o mais certo era ter ido ao privado em vez de ir até Braga na mesma porque felizmente não passo dificuldades. Mas isto representa uma desigualdade de acesso à saúde, com a qual tive o (des)privilégio de ter contacto numa vila do interior e que certamente acontece em muitas outras (porque embora tenha seguro de saúde, costumo dar preferência ao público). Aquela gente também paga impostos… e é muita gente.
Olha esta notícia: https://www.publico.pt/2018/04/06/sociedade/noticia/ja-ha-mais-hospitais-privados-do-que-publicos-1809344
Alguns destes hospitais privados se calhar existem em sítios onde não há um hospital público (faz sentido… um gap por preencher no mercado). Achas que sairia mais barato ao Estado nesses locais construir um hospital de raiz, ou fazer um protocolo com os que já existem? Num caso destes, até mesmo que saísse mais barato construir (coisa que nunca seria possível…) e o fizéssemos, significa ainda assim que a economia portuguesa (temos de começar a pensar mais vezes assim em vez de Estado vs Privados, porque no fim do dia as contas são feitas por todos e com todos, existe um número limite de recursos dentro da nossa economia onde todos operamos) alocou recursos 2x em algo que bastava 1x… isto em economia é uma má afectação dos recursos. Significa que o Estado podia ter alocado esse dinheiro noutra infraestrutura qualquer, ou o mesmo raciocínio para o Privado… a diferença é que o privado, como tem de gerar lucro como dizes e bem (afinal de contas, não trabalha para aquecer… nem os funcionários públicos trabalham para aquecer, o dinheiro vem sempre de algum lado) age de acordo com a lei da procura e da oferta e vai procurar investir onde há mais lacunas ou mais população a ser servida (em sectores como o da saúde… serão locais onde o investimento público fica aquém das necessidades da população). O público pode gastar sem racionalidade, como tem sido sempre feito.
No caso dos transportes, eu sou utente regular da linha de Cascais, mas também uso com frequência a Fertagus (e futuramente… passará a ser numa base diária), e digo-te que a Fertagus recebe muito menos apoios públicos que a CP (antes nem recebia nada, e era por isso que era cara, hoje faz os mesmos preços e recebe o equivalente das validações de passes o que é muito menos de tudo o que a CP recebe, sem gerar buracos a serem tapados pelo Estado como a CP) e presta um serviço muito melhor, sem supressões nem sequer atrasos nos horários. A Margem Sul é composta essencialmente por eleitorado comunista ou de esquerda, e ainda assim a grande maioria prefere que a concessão continue entregue à Fertagus do que passar para as mãos da CP.
Falaste no aspecto dos metros um ser subterrâneo e os outros dois serem de superfície… e dou-te razão nisso. Mas quanto aos serviços, o de Lisboa anda frequentemente com perturbações na linha, ou com as composições a não cumprirem os intervalos de tempo estipulados… e isso nunca acontece no metro de Almada. O metro de Almada cumpre os horários/intervalos de tempo religiosamente e é raro ter perturbações no serviço… e quando tal acontece, é porque algum carro se espetou contra o metro.
E depois surgem inúmeras notas do Tribunal de Contas onde é frequente o custo por aluno ser mais baixo em escolas privadas que públicas, ou onde hospitais públicos geridos por contrato de concessão apresentam melhores contas (sem poupar na qualidade do serviço).
Eu não quero com isto dizer que se deve entregar tudo aos privados cegamente porque isso seria passar do 8 para o 80 e eu acho que a virtude está no meio… quero é dizer que devemos deixar de recorrer cegamente à gestão pública como sempre fizemos.
O importante é a qualidade do serviço e o seu acesso (preço…). Ponto. E a qualidade do serviço e o preço é algo que se acorda nos contratos, assim como o dinheiro a ser metido pelo Estado para que o privado consiga fornecer aquele serviço com aquele preço. De resto… se o operador é público ou se é privado parece-me irrelevante. Isso não tem impacto no acesso a um serviço e a sua qualidade, que é o que importa (a não ser que o Estado faça contratos de treta…).